Educação

Heliópolis, Cícero Dantas, Banzaê e Fátima com maioria de professores sem licenciatura

Igreja do Sagrado Coração de Jesus – Heliópolis – Bahia

Matéria originalmente publicada no Bahia Notícias, seção Municípios, revela que os dados divulgados pelo Censo Escolar 2024 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) realizado pelo Ministério da Educação (Mec), em 10 de fevereiro, registram que pelo menos 22 municípios do interior baiano têm a maioria dos professores da educação atuando sem diploma de bacharelado ou licenciatura. Desses, quatro estão na nossa região do Nordeste da Bahia: Heliópolis, Banzaê, Fátima e Cícero Dantas.

Sabemos que o exercício da docência sem capacitação é ilegal. Embora a formação de muitos desses profissionais não seja completamente inexistente, muitos ocupam cargos pela mera troca de favores políticos. Heliópolis, por exemplo, está com sua eleição subjúdice por ter um eleitorado maior que a população do município. O candidato da oposição, Thiago Andrade, entrou com quatro processos, entre eles o de abuso de poder econômico e captação ilícita de votos, além de pedir revisão eleitoral completa e urgente. Vários profissionais são contratados fora do município, supostamente com o compromisso de transferir o título eleitoral para Heliópolis, com compromisso de votar no prefeito José Mendonça (MDB), que disputava a reeleição. Com isso, o eleitorado ultrapassou o número de moradores.

Dados do Inep enviados ao Bahia Notícias ilustram que diversos municípios têm parte considerável de seus docentes — e, em menor escala, de gestores escolares — com essas formações. Chega-se a um valor de 19,9%, representando quase um em cada cinco professores do estado da Bahia. Ao todo, 22 municípios têm a maioria dos professores — ou seja, mais de 50% — sem diploma de bacharelado ou licenciatura em qualquer área de formação. Voltando à realidade de Heliópolis, é fácil chegar numa escola e perceber 3 ou 4 profissionais por turma, muitos residentes fora do município. Há relatos anônimos de que um contratado divide seu salário com outros 2 ou 3, que não estão listados em folha, embora ninguém se comprometa a provar o que se diz.

Banzaê – Bahia

A lista dos 22 municípios com maioria dos profissionais sem formação são os seguintes:

  • Jitaúna — 67,1%
  • Xique-Xique — 62,9%
  • Cansanção — 60,6%
  • Dário Meira — 60,5%
  • Casa Nova — 59,8%
  • Aramari — 57,6%
  • Banzaê — 56,4%
  • Nova Redenção — 56,2%
  • Heliópolis — 55,2%
  • Ipupiara — 54,8%
  • Fátima — 54,7%
  • Caturama — 53,7%
  • Ibicuí — 53,7%
  • Lapão — 53,7%
  • Elísio Medrado — 53,6%
  • Irajuba — 52,6%
  • Potiraguá — 52%
  • Maraú — 51,3%
  • Rio de Pires — 50,7%
  • Nilo Peçanha — 50,6%
  • Cícero Dantas — 50,5%
  • Barra da Rocha — 50,1%

O levantamento do Inep também revela uma disparidade entre as áreas urbanas e rurais do estado. Proporcionalmente, a falta de diploma de ensino superior é mais expressiva nas zonas rurais, onde 29,2% dos professores não possuem essa formação, em comparação com 16,3% dos professores atuantes em áreas urbanas. Além disso, vários profissionais ensinam disciplinas que não são de sua área de formação, quando há esta formação. Os dados foram revelados pelo Inep na reportagem do Bahia Notícias. Estes são os números por disciplinas de todos os municípios do estado:

    • Matemática: 62,4% dos professores estão devidamente formados (incluindo 0,9% com bacharelado na mesma área); 15,2% lecionam, mas não são formados na área; e 20,3% não possuem formação de nível superior.
    • História: 58,1% dos professores estão devidamente formados (incluindo 1,1% com bacharelado com complementação pedagógica na mesma área); 19,6% lecionam, mas não são formados na área que lecionam; e 20,8% não possuem nenhum diploma de ensino superior.
    • Português: 62,2% dos professores estão devidamente formados (incluindo 1% com bacharelado na mesma área sem complementação); 15,4% lecionam, mas não são formados na área; e 19,4% não possuem diploma de nível superior.
Igreja Matriz de São Francisco de Assis – Fátima – Bahia

Ao considerar as disciplinas da área das ciências da natureza, é importante distinguir as etapas de ensino. Biologia, Química e Física são ensinadas somente a partir do ensino médio. No ensino fundamental, a disciplina correspondente é Ciências. A situação é a seguinte:

  • Ciências: 54,3% dos professores estão devidamente formados em licenciatura (incluindo 1,1% com bacharelado na mesma área); 20,1% lecionam, mas sem formação na área; e 23,7% não possuem diploma de nível superior (com 1,9% não classificados nas categorias analisadas pelo Inep).

Vale ressaltar que, nestas disciplinas, o número de professores devidamente formados aumentou consideravelmente entre 2014 e 2024, ou seja, ao longo de 10 anos em todo o estado a qualificação docente melhorou. Apesar disso, houve estagnações nos últimos dois anos em algumas disciplinas como História e Sociologia.

A atuação de professores sem diploma de licenciatura ou bacharelado, embora não esteja permitida segundo a legislação educacional brasileira, ainda é uma realidade em alguns contextos, sobretudo em municípios do interior, onde há maior dificuldade para atrair profissionais com formação superior, principalmente porque os prefeitos não realizam concursos públicos. Preferem a contratação emergencial por favorecer o jogo político. Curioso é que há municípios que não realizam seleção por concurso há mais de 20 anos e não há uma tomada de providências por parte do Ministério Público Estadual.

É importante lembrar que o curso de Magistério, de nível médio, habilitava profissionais para atuar na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Esse diploma ainda pode ter validade em situações específicas — especialmente para quem o obteve antes da vigência da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/96) —, mas a legislação atual exige, cada vez mais, a formação superior em licenciatura, seja em Pedagogia ou em áreas específicas, bem como a contratação por concurso público, apesar da pouca prática. Ainda é possível encontrar docentes atuando somente com o Ensino Médio ou com formações pedagógicas de curta duração. Embora esses cursos ofereçam alguma base pedagógica, não se equiparam à profundidade e abrangência exigidas por uma graduação, tornando-se insuficientes para atender à maioria das exigências legais da educação básica.

Igreja Matriz de Nossa Senhora do Bom Conselho – Cídero Dantas – Bahia

Outro cenário comum é o de professores que possuem formação de nível superior, mas em áreas diferentes daquelas em que lecionam. A legislação brasileira exige formação específica na área de atuação docente. Quando isso não ocorre, a prática é considerada irregular, a menos que o profissional esteja em processo de complementação pedagógica para obtenção da licenciatura correspondente. Essa situação já vem ocorrendo há algum tempo e parece que os órgãos fiscalizadores entraram em processo de cruzamento de braços diante do problema.

Diante de dados do Censo Escolar 2024 divulgados pelo Inep, a reportagem do Bahia Notícias procurou todas as 22 prefeituras desses municípios. Apenas Fátima, Ibicuí e Caturama responderam. A assessoria da Prefeitura de Ibicuí, no sul da Bahia, contestou os dados do Inep. Em mensagem enviada à equipe de redação, afirmou que o município “tem 156 professores, dos quais apenas 31 não possuem diploma de licenciatura”, o que não corresponderia aos dados federais. Já a Secretaria de Educação de Caturama, no sudoeste baiano, reconheceu os números, explicando que os dados se referem ao ano de 2024 e a gestões anteriores. A atual administração assumiu o município em janeiro de 2025 e, desde então, segundo nota enviada ao Bahia Notícias, vem enfrentando desafios educacionais herdados, buscando reverter o quadro por meio de ações estruturantes na área, embora até aqui não tenha convocado concurso público.

Já a Prefeitura de Fátima também respondeu oficialmente, apresentando seus próprios números: dos 474 profissionais da rede municipal, 90 possuem somente Magistério, 125 são estagiários com ensino superior incompleto, 242 possuem graduação ou pós-graduação, 16 têm mestrado e 1 possui doutorado. Segundo a secretaria de educação municipal, 215 profissionais estariam sem formação superior — o que representaria cerca de 45% do total de professores, uma proporção ainda elevada, mas inferior à apontada pelo Inep e devidamente legal no exercício de estágio. “Reafirmamos nosso compromisso com a educação pública, com a legislação educacional vigente e com a valorização de nossos profissionais”, finaliza o comunicado. Na nota, a gestão de Fátima informou que “investe em formação docente por meio da Lei Municipal nº 287/2008”, que prevê incentivos financeiros para professores que cursam o ensino superior, além de licença remunerada e bolsas para qualificação em programas de mestrado e doutorado”. “Outra legislação recente, a “Lei nº 580/2022, incentiva jovens do município a seguirem carreira docente”, completa. Nada foi dito quanto à realização de concurso público.

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