Brasil

STF diminui o poder das Câmaras de Vereadores

Câmaras municipais têm poder reduzido na fiscalização das contas públicas. (foto: CMRP)

O Poder Legislativo de um município seria, numa democracia plena, a pedra no sapato de corruptos encastelados no Poder Executivo. Um vereador teria o poder de fiscalizar a aplicação do dinheiro público e de rejeitar as contas do alcaide ou aprová-las. Numa decisão tomada em fevereiro deste ano, no julgamento da ADPF 982 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), encerrado na sessão virtual do dia 21 de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) limitou em muito o poder do mandato dos vereadores. Agora, uma vez dado o parecer de um Tribunal de Contas, os vereadores têm apenas que aceitar.

O STF decidiu, pois, por unanimidade, que os Tribunais de Contas têm competência para julgar as contas de prefeitos que atuem como ordenadores de despesas, ou seja, quando eles mesmos autorizam gastos e movimentam recursos públicos. Com isso, as Câmaras Municipais não podem anular ou desconsiderar essas decisões, exceto nos casos com implicações eleitorais, como a inelegibilidade, que continuam sob responsabilidade do Legislativo local. Essa decisão corrige uma interpretação anterior (Tema 835), que dava às Câmaras o poder de julgar todas as contas dos prefeitos, mesmo as de gestão.

Agora, o STF deixou claro que as contas de gestão, ou seja, aquelas relativas à administração direta de recursos, que avaliam a legalidade, legitimidade e eficiência dos atos administrativos de quem movimenta recursos públicos diretamente, não são da alçada dos vereadores. Por exemplo, licitações, contratos, pagamentos, folha de pessoal, compras públicas etc, é da competência exclusiva dos Tribunais de Contas, com decisão técnica e vinculante. Trazendo para nossa realidade, a empresa fantasma da Praça Isabel Ribeiro que vendeu merenda para a Prefeitura de Heliópolis é competência de análise do TCM desta nossa Bahia de meu Deus. Vereador só pode denunciar como qualquer cidadão pode fazer.

Só restou para os vereadores a chamadas contas de governo, relativas à execução orçamentária geral. Ou seja, o vereador terá poder sobre a condução das políticas públicas, execução do orçamento e cumprimento de metas fiscais. Se o prefeito aplicou corretamente os recursos em saúde e educação, se cumpriu a Lei de Responsabilidade Fiscal, se o orçamento foi executado conforme o planejado ele pode aprovar as contas. Caso contrário, pode rejeitá-las, mesmo com parecer favorável ou não do Tribunal de Contas.

Esta decisão do STF tem implicações profundas e imediatas para os prefeitos que atuam como ordenadores de despesa — ou seja, que autorizam diretamente gastos públicos. Muitos prefeitos se aproveitavam do controle da maioria nas câmaras para derrubarem decisões dos tribunais. Agora respondem diretamente aos Tribunais de Contas, que podem aplicar sanções financeiras (como multas e devolução de valores) sem necessidade de aprovação das Câmaras Municipais. Isso aumenta o poder dos governadores. São eles que nomeiam os membros dos tribunais. Num estado como a Bahia, onde tudo é politizado, a camada de proteção superior dos administradores municipais junto ao TCM ficará mais visível.

Por outro lado, agora ficará clara a separação entre contas de gestão e de governo. A medida fortalece o papel técnico dos Tribunais de Contas e evita interpretações divergentes que enfraqueciam o controle sobre os gastos públicos, ao mesmo tempo em que fortalece sobremaneira o TCM da Bahia, que para punir um prefeito leva muito tempo, além de sempre se ancorar numa tal de “ressalvas”, quando aprovam contas de costumeiros desviadores de recursos públicos. O ponto bom dessa história é que, apesar de os Tribunais de Contas poderem aplicar sanções administrativas e financeiras, a inelegibilidade de prefeitos ainda depende da rejeição das contas de governo pela Câmara Municipal, conforme a Lei da Ficha Limpa.

Uma consequência boa desta decisão é que estão anuladas decisões judiciais que protegiam prefeitos. Após o julgamento da ADPF 982, o STF invalidou decisões judiciais que haviam derrubado punições aplicadas por Tribunais de Contas a prefeitos. Isso ocorreu, por exemplo, em casos onde prefeitos haviam sido multados ou obrigados a devolver recursos, mas conseguiram reverter essas sanções na Justiça. Agora, essas reversões estão sendo anuladas.

Por fim, em resumo, as contas de governo avaliam o “como” o governo foi conduzido e isso ficará ao inteiro dispor dos vereadores. As contas de gestão avaliam o “o que” foi feito com o dinheiro público e isso será da alçada exclusiva dos Tribunais de Contas. Em estados como a Bahia, duvidamos que mudará alguma coisa, a não ser para pior. Mas onde os critérios são técnicos, pode ser que haja algum ganho no combate à corrupção, que assola a nação de Norte a Sul. A decisão também vale para os governos de estado e para o governo federal.

Colaborou: Cleiton Rodrigues.

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