Heliópolis

Simone, prefeita?

A dificuldade em punir políticos corruptos no Brasil é resultado de uma combinação complexa de fatores institucionais, jurídicos, culturais e políticos. Réus com bons advogados usam sucessivos recursos para adiar decisões, o que pode levar décadas até uma condenação definitiva. Muitos processos se arrastam tanto que acabam prescritos, ou seja, o Estado perde o direito de punir. Autoridades como deputados e senadores são julgadas apenas por tribunais superiores, o que reduz a chance de condenações rápidas. Mas há casos em que não há punição porque o Estado fecha os olhos para a corrupção, quando ela acontece com algum aliado encastelado no poder. Esse parece ser o caso de Heliópolis. O prefeito reeleito do município, ao que tudo indica, mesmo com as facilidades do processo, não consegue pagar as dívidas da campanha eleitoral de 2024 e há um zunzunzum de que poderá passar o cargo para a vice-prefeita como caminho para se livrar dos problemas financeiros.

Em Heliópolis, na Bahia, políticos, empresários e servidores públicos se envolvem em esquemas de corrupção que seguem exatamente esse padrão: financiamento de campanhas ou apoio político seguido de retorno financeiro por meio de obras superfaturadas e desvio de recursos públicos. E isso não é exclusividade do município. Em todo o Brasil, políticos direcionam verbas públicas para obras em municípios específicos, editais são ajustados para favorecer empresas previamente escolhidas, eliminando concorrência legítima. Além do superfaturamento, obras são construídas de baixa qualidade, com contratos incluindo serviços não realizados, medições adulteradas ou materiais de péssima qualidade. O dinheiro desviado é movimentado por empresas de fachada, contas de “laranjas” e até em espécie, dificultando o rastreamento. Em Heliópolis, tem até empresa fantasma vendendo para a merenda escolar.

Muito de toda essa grana desviada vai também para pagamento de financiamento de campanha. É o caso de Heliópolis. O maior investidor na campanha política de José Mendonça Dantas (MDB), atual prefeito de Heliópolis, é o esposo da atual vice-prefeita. Há relatos não comprovados de que a campanha custou algo em torno de 13 milhões. Esse dinheiro será pago pelo município, claro, a partir de esquemas de corrupção. No período eleitoral, o voto comprado em Heliópolis disparou como o mais caro em toda a região, a ponto de, segundo relatos anônimos, trazer para as seções eleitorais do município, mais de 3 mil eleitores de várias cidades da região e do estado de Sergipe. Heliópolis não tem indígenas e vários deles votaram por aqui nas eleições de 2024, originários da cidade de Banzaê.

O que salva o atual prefeito é a cultura de impunidade. A repetição de escândalos gera uma sensação de que “todos fazem”, o que reduz a indignação pública e acaba transformando a situação numa coisa corriqueira, normal. Também, a população, muitas vezes, não acompanha de perto o desempenho dos políticos nem cobra com firmeza. Além disso, é comum a existência de uma oposição, sem generalizar, que espera a sua vez de fazer o mesmo. José Mendonça e outros prefeitos são salvos ainda pelas falhas nas instituições de controle, com órgãos enfraquecidos, tribunais de contas, controladorias e ministérios públicos sem autonomia ou recursos suficientes e, principalmente, cargos estratégicos ocupados por aliados, o que compromete investigações e julgamentos imparciais. Com tudo isso, há algo que pode determinar o fim de uma era: a alto custo de uma campanha dentro desse padrão.

Talvez por isso haja um projeto sendo construído nos bastidores, que poderá aliviar a situação do atual prefeito. A solução que soa ao pé do ouvido é a renúncia do atual prefeito, passando o cargo para sua vice, Simone Andrade. O motivo é que o prefeito só consegue pagar os juros do dinheiro investido em sua campanha e ele corre risco de terminar o mandato devendo tudo. Ao passar o cargo a Simone, passaria também todas as dívidas para o esposo da vice-prefeita, Celso Andrade, principal financiador da reeleição de José Mendonça. Se isso é verdade ou não, só o tempo revelará. Mas certo é que as licitações milionárias de aquisição de combustíveis, a compra de merenda escolar por empresas fantasmas e outras desgraças não estão sendo suficientes para matar a fome financeira dos que investiram naquele que prometeu fazer Heliópolis grande mais uma vez. (Landisvalth Lima)

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