Brasil

Paratinga, Boquira, Ibipitanga e Félix Mendonça na mira da Polícia Federal

O prefeito de Ibipitanga – Humberto Raimundo Rodrigues de Oliveira (PT) e o prefeito de Boquira, Alan Machado França (PSB) foram presos e afastados dos cargos. Já o ex-prefeito de Paratinga, Marcel José Carneiro de Carvalho (PT) passou por mandado de buscas.

A chaga da corrupção está cada vez mais em processo de metástase por todo o país. Mais uma vez, a Bahia está no cenário de mais um descândalo, desta vez envolvendo o deputado federal Félix Mendonça (PDT). A quarta fase da Operação Overclean foi deflagrada ontem, 27 de junho, na Bahia, com o objetivo de desarticular um esquema de desvio de emendas parlamentares, fraudes em licitações e lavagem de dinheiro. A ação foi conduzida pela Polícia Federal em conjunto com a CGU e a Receita Federal, com autorização do STF.

Foram cumpridos 16 mandados de busca e apreensão em Salvador, Camaçari, Boquira, Ibipitanga e Paratinga. Dois prefeitos — Humberto Raimundo Rodrigues de Oliveira (Ibipitanga) e Alan Machado França (Boquira) — foram afastados dos cargos e presos em flagrante por porte ilegal de arma. O ex-prefeito de Paratinga, Marcel José Carneiro de Carvalho, também foi alvo da operação, e uma grande quantia em dinheiro foi apreendida em sua residência.

A investigação aponta que o esquema operava entre 2021 e 2024, com o repasse irregular de emendas parlamentares mediado pelo deputado federal Félix Mendonça Júnior (PDT-BA), cujo assessor, Marcelo Chaves Gomes, é suspeito de ser o operador financeiro do grupo. O deputado teve o sigilo telefônico quebrado, mas não foi alvo de mandado de busca.

Os crimes investigados incluem organização criminosa, corrupção ativa e passiva, peculato, fraude em licitações e lavagem de dinheiro.

O esquema investigado na Operação Overclean funcionava, segundo a Polícia Federal, por meio de um ciclo de corrupção envolvendo parlamentares, prefeitos e empresários.

Com o ex-prefeito de Paratinga – Marcel José Carneiro de Carvalho (PT), foi encontrado 3,2 milhões em espécie.

Como funcionava o esquema

– Indicação de emendas parlamentares

O deputado federal Félix Mendonça Júnior (PDT-BA) destinava emendas parlamentares para municípios onde tinha base eleitoral, como Boquira, Ibipitanga e Paratinga, entre 2021 e 2024.

– Liberação mediante propina

Para que os recursos fossem efetivamente liberados, havia pagamento de vantagens indevidas (propina). O operador financeiro do esquema seria o assessor do deputado, Marcelo Chaves Gomes, que atuava como intermediário entre o gabinete e os gestores municipais.

– Manipulação de licitações

Após a liberação dos recursos, as prefeituras envolvidas — comandadas por Humberto Raimundo Rodrigues de Oliveira (Ibipitanga), Alan Machado França (Boquira) e Marcel José Carneiro de Carvalho (ex-prefeito de Paratinga) — fraudavam licitações para beneficiar empresas ligadas ao grupo.

– Lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito

O dinheiro desviado era supostamente lavado por meio de contratos superfaturados e empresas de fachada. Na casa do ex-prefeito de Paratinga, por exemplo, a PF encontrou R$ 3,2 milhões em espécie escondidos em gavetas e armários.

– Aparente legalidade

O deputado afirma que as emendas foram destinadas “com ganho exclusivamente político” e que não sabia de irregularidades. Já os prefeitos negam envolvimento e dizem estar colaborando com a Justiça.

O nome do deputado federal Félix Mendonça aparece em duas fases da Operação Overclean.

Valores das emendas enviadas

A investigação aponta que o deputado Félix Mendonça Júnior enviou cerca de R$ 18 milhões em emendas parlamentares para os municípios de Boquira, Ibipitanga e Paratinga entre 2021 e 2024. Desse total:

– Paratinga: R$ 7,2 milhões

– Ibipitanga: R$ 6 milhões

– Boquira: R$ 4,8 milhões

Essas emendas foram repassadas através de convênios com ministérios como o da Saúde e o do Desenvolvimento Regional, principalmente para obras e aquisição de equipamentos.

O que são emendas Pix?

As chamadas emendas Pix são um tipo de repasse de recursos do governo federal para estados e municípios em que o dinheiro cai diretamente na conta do ente beneficiado, sem necessidade de convênio prévio ou prestação detalhada de contas ao ministério repassador. Isso torna o processo mais ágil, mas também mais vulnerável a desvios, justamente por ter menos controles.

Essas emendas começaram a ganhar força a partir de 2020 e, no caso da Operação Overclean, parte dos valores investigados foi enviada nesse formato. Por isso, os investigadores têm dado atenção especial a esses repasses — e cobrado maior transparência na destinação.

As famosas emandas Pix estão dando trabalho aos órgãos de investigação.

Histórico da Operação Overclean

– 1ª fase (setembro de 2023)

Investigou fraudes na compra de medicamentos por prefeituras baianas. A PF apreendeu documentos em Salvador, Barreiras e Luís Eduardo Magalhães. Dois empresários foram presos e apontados como operadores de um esquema que superfaturava contratos na área da saúde.

– 2ª fase (março de 2024)

Avançou para contratos de pavimentação urbana com uso de verbas federais. Houve cumprimento de mandados em Brasília e cidades do interior da Bahia. Descobriu-se que parte dos recursos vinha de emendas Pix e que empresas de fachada participavam das licitações.

– 3ª fase (dezembro de 2024)

Aprofundou a investigação em lavagem de dinheiro. A PF rastreou movimentações suspeitas de cerca de R$ 30 milhões, envolvendo empresas de comunicação e consultorias vinculadas a políticos e prefeitos. Foi nessa fase que o nome do deputado Félix Mendonça Júnior apareceu pela primeira vez, mas sem mandados diretos.

– 4ª fase (junho de 2025)

A fase mais recente, que resultou nos afastamentos e prisões em flagrante de prefeitos e na quebra de sigilo de parlamentares. É considerada a mais contundente da operação até agora.

Conexões com outras investigações

A Overclean tem ligações com:

– Operação Sanguessuga (2006): Um dos delatores usou os mesmos métodos de simulação de licitações para desviar recursos na época. A PF acredita que o padrão foi “reciclado” e adaptado ao novo modelo de emendas.

– Casos no Rio Grande do Norte e Maranhão: Investigações em curso mostram esquemas semelhantes envolvendo emendas Pix e parlamentares de outros estados. A Controladoria-Geral da União está comparando os dados para identificar uma possível articulação nacional.

O que dizem os envolvidos?

Aqui estão os principais posicionamentos das defesas dos envolvidos na Operação Overclean:

– Humberto Raimundo Rodrigues de Oliveira (prefeito afastado de Ibipitanga): até o momento, não há nota pública da defesa dele. Ele foi preso em flagrante por porte ilegal de arma, mas ainda não se manifestou oficialmente sobre as acusações de envolvimento no esquema de desvio de emendas parlamentares.

– Alan Machado França (prefeito afastado de Boquira): também preso por porte ilegal de arma, foi liberado após pagamento de fiança. Sua assessoria jurídica confirmou a soltura, mas não divulgou o valor nem apresentou nota formal de defesa sobre as acusações de corrupção e fraude.

– Marcel José Carneiro de Carvalho (ex-prefeito de Paratinga): sua defesa divulgou uma nota afirmando que a busca e apreensão foi recebida com “absoluta tranquilidade” e que ele está à disposição das autoridades. A nota destaca que Marcel tem uma vida privada “construída com esforço e integridade” e que a defesa adotará todas as medidas para demonstrar a legalidade de sua atuação como gestor.

– Deputado federal Félix Mendonça Júnior (PDT-BA): afirmou ter sido “surpreendido” ao ser citado na operação. Negou qualquer irregularidade no envio de emendas parlamentares e disse que os recursos foram destinados “de forma lícita, com obtenção de ganho exclusivamente político”. Ele também declarou que sempre atuou com ética e está colaborando com as investigações.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *